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Cometa 3I/ATLAS surpreende astrônomos com mudança química após o periélio

O Cometa 3I/Atlas não é apenas mais um ponto brilhante cruzando o nosso céu. Ele é o terceiro objeto interestelar já detectado, um viajante cósmico que atravessou as vastas distâncias entre as estrelas para nos fazer uma visita. E, como todo bom visitante de outro mundo, ele está cheio de surpresas. A mais recente delas? Uma mudança radical em sua composição química após sua passagem mais próxima do Sol, o periélio.

Este fenômeno está reescrevendo o que pensávamos saber sobre a formação e a evolução dos cometas que nascem em outros sistemas estelares. Os astrônomos do Observatório TRAPPIST-North, no Marrocos, acabam de divulgar novos dados que mostram o Cometa 3I/Atlas se transformando de um objeto “exótico” para um cometa “típico” em questão de semanas. É como se ele tivesse trocado de roupa para se sentir mais à vontade em nosso Sistema Solar.

Acompanhe esta jornada para entender como este cometa interestelar está desafiando a ciência e o que ele pode nos ensinar sobre os blocos de construção de mundos distantes.

Imagem do cometa interestelar 3I/ATLAS, composta por 24 exposições de 60 segundos cada, mostrando o núcleo brilhante e uma cauda de gás alongada, com indícios de uma cauda de poeira e uma anti-cauda sutil. A captura foi feita pelo astrofotógrafo Satoru Murata usando um telescópio de 0,2 m.
O cometa interestelar 3I/ATLAS ressurge após passar atrás do Sol e revela uma cauda de gás complexa, com sinais de poeira e até uma anti-cauda tênue. A imagem, composta por 24 exposições de 60 segundos, foi capturada pelo astrofotógrafo Satoru Murata com um telescópio de 0,2 m.
Créditos: Satoru Murata

A Jornada Cósmica do Cometa 3I/Atlas: Um Viajante de Outro Sistema

O Cometa 3I/Atlas, formalmente conhecido como C/2025 N1 (ATLAS), foi descoberto em julho de 2025 pelo sistema de alerta de impacto terrestre ATLAS (Asteroid Terrestrial-impact Last Alert System). O “3I” em seu nome é a chave para sua importância: ele marca o terceiro objeto interestelar confirmado a passar pelo nosso Sistema Solar, depois de ‘Oumuamua e 2I/Borisov. Além disso, sua descoberta confirmou que a visita de objetos de outros sistemas estelares não é um evento isolado, mas sim um fenômeno que podemos começar a estudar com mais frequência.

A principal característica que o denuncia como um forasteiro é sua órbita. Diferente dos cometas “nativos” que circulam o Sol em órbitas elípticas, o 3I/Atlas possui uma órbita hiperbólica. Portanto, ele não está gravitacionalmente ligado ao nosso Sol. Ele está apenas de passagem, impulsionado por uma velocidade impressionante que ultrapassa os 68 km/s (cerca de 245.000 km/h). Essa velocidade é a prova irrefutável de que ele se originou em um sistema estelar distante e foi ejetado para o espaço interestelar.

A análise inicial de sua composição, antes de atingir o ponto mais próximo do Sol (o periélio), já indicava que ele era um cometa incomum. Ele parecia ter uma deficiência de moléculas de cadeia de carbono, como o C2 e o C3, o que o classificava como um cometa “depleted” (esgotado) ou exótico. Assim, essa característica sugeria que ele poderia ter se formado em um ambiente estelar muito diferente do nosso, talvez em um disco protoplanetário com uma química distinta. Os cientistas estavam ansiosos para ver como este cometa se comportaria ao se aproximar do calor do nosso Sol.

O Mistério da Composição: De Exótico a “Comum”

A verdadeira reviravolta na história do Cometa 3I/Atlas veio após sua passagem pelo periélio, que ocorreu no final de outubro de 2025. Os astrônomos do TRAPPIST-North, liderados por E. Jehin, realizaram observações cruciais em novembro, cerca de um mês após o ponto de maior aproximação do Sol. Eles usaram filtros de banda estreita para medir as taxas de produção de gás e poeira, focando nas moléculas que se sublimam do núcleo.

Os dados coletados focaram nas taxas de produção de gás e poeira, medindo a quantidade de moléculas voláteis liberadas pelo núcleo do cometa. As moléculas observadas — hidroxila (OH), cianeto (CN), carbono diatômico (C2) e amina (NH) — são como impressões digitais químicas que revelam a composição do núcleo. Contudo, a amina (NH) estava muito fraca, enquanto as outras eram facilmente detectadas.

O que os cientistas descobriram foi surpreendente. As taxas de produção de gás e os valores de Afrho (um indicador da produção de poeira) estavam significativamente mais altos do que o esperado. Por exemplo, os novos valores de Afrho eram quatro vezes maiores do que os medidos pelo próprio TRAPPIST antes do periélio, indicando um claro aumento de atividade. Dessa forma, o cometa estava liberando muito mais material do que antes, o que é comum após o periélio, mas a magnitude do aumento chamou a atenção.

Imagem detalhada do cometa interestelar 3I/ATLAS composta por 22 exposições de 30 segundos cada. A cauda do cometa aparece longa e bem definida contra um fundo repleto de estrelas, revelando variações sutis de brilho e estrutura. Foto capturada pelo astrofotógrafo Francois Kugel com um telescópio de 0,4 m.
Uma nova imagem do cometa interestelar 3I/ATLAS, criada a partir de 22 exposições de 30 segundos e registrada pelo astrofotógrafo Francois Kugel com um telescópio de 0,4 m. A foto destaca a estrutura alongada da cauda do cometa e a sutileza dos detalhes revelados conforme ele retorna à visibilidade sob céus escuros. Créditos Francois Kugel

A Transformação Química do Núcleo: O Efeito C2

O achado mais intrigante foi a mudança na proporção entre as moléculas de carbono. Antes do periélio, o cometa era classificado como “depleted” em C2 e C3. No entanto, as novas observações detectaram uma forte emissão de C2 e uma clara emissão de C3, resultando em uma proporção log(QC2/QCN) de +0.04. Portanto, essa nova proporção o move da categoria de cometa exótico para a de cometa típico (ou “normal”), semelhante aos cometas que se originam na Nuvem de Oort do nosso próprio Sistema Solar.

Essa transformação levanta questões profundas. Além disso, como um cometa interestelar, que deveria ter uma composição homogênea, pode mudar sua assinatura química de forma tão drástica? Os pesquisadores propõem duas hipóteses principais para explicar a súbita riqueza em C2 e C3:

  1. Núcleo Inomogêneo: O núcleo do cometa pode não ser uniforme. A camada externa, que sublimou antes do periélio, era pobre em C2. Enquanto isso, as camadas mais internas, expostas pelo calor do Sol após o periélio, são ricas em C2, revelando uma composição diferente. Se esta hipótese estiver correta, o 3I/Atlas é um objeto com uma história de formação complexa, com diferentes materiais agregados em diferentes momentos.
  2. Efeito Sazonal: A liberação de C2 e C3 pode ter sido atrasada até que o cometa estivesse muito próximo do Sol, ou o calor intenso pode ter desencadeado uma reação química ou física que liberou essas moléculas em maior quantidade. Assim, o aumento da temperatura pode ter atingido reservatórios de moléculas orgânicas mais voláteis que estavam protegidos no interior do núcleo.

A Surpreendente Produção de Poeira

Outro dado crucial é a alta produção de poeira do Cometa 3I/Atlas. Ele apresenta uma grande razão poeira/gás, com valores de log(afrho/CN) de -22.0 e log(afrho/OH) de -24.6. Esses números o classificam como um cometa de alta produção de poeira em comparação com os cometas da Nuvem de Oort. Por outro lado, a presença de uma cauda de íons estreita, provavelmente de CO+, foi detectada no filtro CN, o que adiciona mais uma camada de complexidade ao seu perfil.

A combinação de uma composição de gás “típica” com uma alta produção de poeira o torna um objeto híbrido fascinante. Ele carrega características de seu lar distante, mas reage ao nosso Sol de maneiras que nos são familiares. Portanto, o 3I/Atlas é um laboratório natural para estudar a interação entre um objeto interestelar e a radiação solar.

O Que o Cometa 3I/Atlas Nos Ensina Sobre Outros Mundos

O Cometa 3I/Atlas é, em essência, uma cápsula do tempo de um sistema estelar distante. Sua passagem nos oferece uma oportunidade única de estudar a matéria-prima de outros mundos sem precisar enviar uma sonda espacial para lá. Dessa forma, cada molécula liberada é uma pista sobre a formação de planetas e a química orgânica em galáxias distantes.

A descoberta de que sua composição se tornou “típica” após o periélio sugere que os blocos de construção de cometas em outros sistemas estelares podem não ser tão diferentes dos nossos quanto se pensava. Assim, a química orgânica básica necessária para a formação de vida pode ser um fenômeno universal, e não uma peculiaridade do nosso Sistema Solar.

A comunidade científica está em polvorosa. Observações de outras missões, como as da ESA com a ExoMars e a Mars Express, também estão sendo analisadas para complementar os dados terrestres . Contudo, a confirmação final da mudança de composição por meio de espectroscopia ainda é aguardada, mas os dados do TRAPPIST-North são um forte indicativo.

O estudo do Cometa 3I/Atlas também nos ajuda a entender melhor a dinâmica de objetos interestelares. O primeiro, ‘Oumuamua, era um objeto rochoso e alongado, sem cauda. O segundo, 2I/Borisov, era um cometa mais tradicional. O 3I/Atlas, com sua mudança de composição, mostra que a diversidade de visitantes interestelares é muito maior do que imaginávamos.

No centro da imagem está um cometa que se apresenta como um casulo azulado em formato de gota, formado por poeira que se desprende do núcleo sólido e gelado do cometa, visto contra um fundo preto. O cometa parece estar se movendo em direção ao canto inferior esquerdo da imagem. Cerca de uma dúzia de rastros diagonais curtos e azul-claro estão espalhados pela imagem — são estrelas de fundo que pareceram se mover durante a exposição, já que o telescópio estava acompanhando o movimento do cometa.
O Telescópio Espacial Hubble tambem registrou, com detalhes impressionantes, o cometa interestelar 3I/ATLAS

O Segredo do Viajante Cósmico

O Cometa 3I/Atlas nos lembra que o universo é um lugar de constante movimento e surpresa. Ele veio de longe, carregando a poeira e o gás de um sistema estelar que talvez nem exista mais, e nos mostrou que até mesmo os visitantes mais exóticos podem ter um lado familiar.

Sua transformação de um cometa quimicamente “esgotado” para um “típico” é um lembrete de que a complexidade do cosmos se esconde nos detalhes. Que outros segredos este viajante cósmico ainda guarda em seu núcleo gelado? Acompanhar a ciência é como desvendar um mistério intergaláctico, e o Cometa 3I/Atlas é o nosso mais novo e intrigante enigma.

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FAQ: Perguntas Rápidas Sobre o Cometa 3I/Atlas

1. O que é o Cometa 3I/Atlas? O Cometa 3I/Atlas é o terceiro objeto interestelar (designado com “3I”) confirmado a passar pelo nosso Sistema Solar, vindo de outro sistema estelar.
2. Por que ele é considerado um objeto interestelar? Ele é classificado como interestelar devido à sua órbita hiperbólica, o que indica que ele não está gravitacionalmente ligado ao nosso Sol e está apenas de passagem.
3. O que significa a mudança de composição do Cometa 3I/Atlas? A mudança significa que o cometa passou de uma composição quimicamente “esgotada” (pobre em C₂ e C₃) para uma composição típica de cometas da Nuvem de Oort, provavelmente devido à exposição de camadas internas do núcleo após o periélio.
4. O que são C2 e C3 nos cometas? C₂ (carbono diatômico) e C₃ (carbono triatômico) são moléculas de cadeia de carbono que se sublimam do núcleo e são indicadores importantes da química orgânica e do ambiente de formação do cometa.
5. Qual a importância do Cometa 3I/Atlas para a ciência? Ele permite que os cientistas estudem a matéria-prima de outros sistemas estelares, oferecendo insights sobre a formação planetária e a universalidade da química orgânica no cosmos.
6. O que é o periélio? O periélio é o ponto da órbita de um corpo celeste onde ele está mais próximo do Sol. No caso do Cometa 3I/Atlas, o periélio ocorreu no final de outubro de 2025.
7. O que é o Observatório TRAPPIST-North? O TRAPPIST-North é um telescópio robótico localizado no Observatório de Oukaimeden, no Marrocos, que foi crucial para as novas observações do Cometa 3I/Atlas.

Indicação de Leitura

Gostou do nosso artigo? Então, continue explorando e veja as outras matérias que preparamos sobre esse incrível e misterioso visitante interestelar. Descubra como o 3I/ATLAS está ajudando cientistas da ESA e da NASA a desvendar os segredos dos cometas que vagam entre as estrelas e o que essas descobertas podem revelar sobre a formação dos mundos.

Sugestões de Links Internos (Inbound)

Sugestões de Links Externos (Outbound):

Fonte:

NASA. Cometa 3I/ATLAS. Disponível em: https://ciencia.nasa.gov/sistema-solar/cometa-3i-atlas/
Ciência.gob.es. 3I/ATLAS: el cometa interestelar que visita nuestro sistema solar. Disponível em: https://www.ciencia.gob.es/Noticias/2025/octubre/cometa-3I-ATLAS-visita-nuestro-sistema-solar.html
Jehin, E. et al. TRAPPIST first post-perihelion production rates of the Interstellar comet 3I/ATLAS. ATel #17515. Disponível em: https://www.astronomerstelegram.org/?read=17515
ESA. ESA’s ExoMars and Mars Express observe comet 3I/ATLAS. Disponível em: https://www.esa.int/Science_Exploration/Space_Science/ESA_s_ExoMars_and_Mars_Express_observe_comet_3I_ATLAS

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