Onde a Vida Começa: A Descoberta Histórica do JWST
Imagine um universo onde os ingredientes básicos para a vida estão espalhados por toda parte, congelados em grãos de poeira cósmica, esperando apenas o calor de uma estrela nascente para despertar. Essa não é uma cena de ficção científica, mas sim a realidade que o Telescópio Espacial James Webb (JWST) está nos ajudando a desvendar. Recentemente, o JWST fez uma descoberta que reescreve nosso entendimento sobre a química do cosmos: a primeira detecção de Moléculas Orgânicas Complexas JWST ao redor de uma protoestrela em uma galáxia vizinha, a Grande Nuvem de Magalhães (LMC).
Essa detecção histórica não apenas prova que a química orgânica é universal, mas também nos dá pistas cruciais sobre a rapidez com que os blocos de construção da vida podem se formar no universo. A busca por vida fora da Terra muitas vezes começa com a busca por água, mas, na verdade, ela começa com a química. E, de acordo com a astrônoma Marta Sewiło, líder da pesquisa, o JWST está abrindo um novo campo de estudo sobre a química em ambientes de formação estelar.

A Caçada Cósmica: Como o JWST Encontrou Moléculas Orgânicas Complexas
A estrela em questão é a ST6, uma protoestrela massiva localizada na região de formação estelar N158, dentro da Grande Nuvem de Magalhães. Esta galáxia anã, a cerca de 163.000 anos-luz de distância, serve como um laboratório cósmico perfeito. O JWST, com seu instrumento de Infravermelho Médio (MIRI), possui a sensibilidade necessária para identificar as assinaturas químicas dessas moléculas, mesmo quando estão congeladas.
As Moléculas Orgânicas Complexas JWST (COMs) são definidas como moléculas que contêm carbono e mais de seis átomos. Muitas delas são precursoras químicas dos blocos de construção da vida, como o RNA e os aminoácidos. A equipe de Sewiło usou o MIRI para analisar o gelo que reveste os grãos de poeira ao redor da ST6. Esta é a primeira vez que os astrônomos detectam COMs em sua fase de gelo fora da nossa Via Láctea.
A detecção de Moléculas Orgânicas Complexas JWST em sua fase congelada é um feito notável. Anteriormente, os cientistas já haviam encontrado COMs em sua fase gasosa em protoestrelas na LMC. Contudo, a fase de gelo representa um estágio químico anterior e mais frio da formação estelar. Segundo Sewiło, até hoje, os astrônomos detectaram COMs congeladas em apenas quatro protoestrelas na Via Láctea e agora, graças ao JWST, em uma na LMC: a ST6.

Sobre cada imagem está sobreposta a abertura circular de extração espectral, com um diâmetro igual a 3 × FWHMₚₛf,λ, onde FWHMₚₛf,λ é a largura total à meia altura (FWHM) empiricamente derivada da função de espalhamento pontual (PSF) do MIRI MRS em um determinado comprimento de onda (λ; veja a Seção 2 para mais detalhes).
Créditos: NASA / ESA / CSA / The James Webb Space Telescope; M. Sewiło et al. (2025), “Complex organic molecules in ices around a massive protostar outside the Milky Way”, The Astrophysical Journal Letters.
Os Blocos de Construção da Vida: O Que São as COMs Congeladas?
A lista de COMs identificadas ao redor da ST6 é fascinante. Ela inclui moléculas que você pode reconhecer do seu dia a dia, mas que, no espaço, assumem um papel fundamental na astrobiologia. Entre as moléculas confirmadas, estão:
- Acetaldeído
- Ácido acético (presente no vinagre)
- Etanol (o álcool que bebemos)
- Metanol
- Formato de metila
Além dessas, o JWST detectou pelo menos outras 14 COMs, cuja identidade a equipe ainda tenta confirmar. O formato de metila e o acetaldeído, por exemplo, são usados como produtos químicos industriais na Terra. No entanto, no espaço, eles formam a espinha dorsal de moléculas de “segunda geração” ainda mais complexas, que, por sua vez, constroem aminoácidos e moléculas de RNA.
A presença dessas Moléculas Orgânicas Complexas JWST congeladas indica o quão evoluída está a química do material que cerca as protoestrelas, mesmo nos estágios mais iniciais da formação estelar. Quando as nuvens de gás molecular colapsam para formar estrelas, elas estão extremamente frias, com temperaturas abaixo de 100 Kelvin. Nesse frio intenso, as moléculas complexas se condensam em gelo sobre os grãos de poeira. Somente mais tarde, quando a protoestrela esquenta, o gelo sublima, liberando as COMs como gases.
O Laboratório do Universo Primitivo: Química Orgânica na LMC
A Grande Nuvem de Magalhães (LMC) não é apenas uma vizinha; ela é um portal para o passado. Suas condições são semelhantes às das galáxias que existiam quando o universo era muito mais jovem. Por outro lado, a LMC tem uma abundância menor de elementos mais pesados que hidrogênio e hélio (a chamada “baixa metalicidade”) e um campo de radiação ultravioleta (UV) mais forte do que a Via Láctea.
Portanto, estudar a química orgânica na LMC ajuda os cientistas a entenderem a química do universo primitivo. Isso permite que eles estabeleçam limites sobre a rapidez com que os blocos de construção da vida puderam se formar. A baixa metalicidade, por exemplo, poderia impactar a abundância de COMs, enquanto a radiação UV mais intensa poderia acelerar as reações químicas.
De fato, a escassez de elementos pesados na LMC parece ter afetado a quantidade de COMs ao redor da ST6. Segundo Sewiło, as abundâncias de gelo de COM em relação ao gelo de água medidas para a ST6 são menores do que as medidas para as protoestrelas da Via Láctea, com uma exceção notável: o ácido acético. A sobreabundância de gelo de ácido acético provavelmente resulta do fluxo de UV mais alto na LMC.
Entre as 14 linhas de absorção ainda não identificadas no espectro da ST6, pode estar o glicolaldeído. Esta molécula é um precursor químico da ribose, um componente essencial das moléculas de RNA. A detecção, contudo, ainda não é conclusiva, pois, de acordo com Sewiło, mais espectros de laboratório são necessários para verificar a informação.

O retângulo amarelo destaca o campo de visão da imagem mostrada no painel da direita: um mosaico em três cores da região N158, combinando imagens do Spitzer/SAGE IRAC 8.0 μm (vermelho), 4.5 μm (verde; M. Meixner et al. 2006) e MCELS Hα (azul; R. C. Smith & Equipe MCELS 1998).
A posição de ST6 está indicada com um círculo branco e identificada por rótulo. O inset (imagem ampliada) mostra um zoom de ST6 e seus arredores.
Os contornos representam a emissão de ¹³CO (2–1), com níveis de contorno correspondendo a (10, 20, 40, 80)% do pico de emissão de 12,4 Jy beam⁻¹ km s⁻¹; o tamanho do feixe sintetizado é de 7″ × 7″.
Mais detalhes podem ser encontrados no Apêndice A.
Créditos: NASA / ESA / CSA / The James Webb Space Telescope; M. Sewiło et al. (2025), “Complex organic molecules in ices around a massive protostar outside the Milky Way”, The Astrophysical Journal Letters.
O Próximo Capítulo da Astrobiologia
À medida que a protoestrela ST6 evolui e se aquece, o gelo nos grãos de poeira mais próximos sublimará, e as COMs passarão para a fase gasosa. É na fase gasosa que mais reações químicas podem ocorrer, impulsionadas pela radiação UV da protoestrela e do ambiente. Dessa forma, essas reações levam a moléculas maiores e mais complexas, importantes para a vida, como o propanol e o propanal, e possivelmente até aminoácidos.
Embora a equipe ainda não tenha detectado aminoácidos na ST6, a implicação dessa descoberta é profunda. Aminoácidos já foram encontrados em cometas e meteoritos no nosso próprio Sistema Solar. Esses corpos são antigos, formados há 4,5 bilhões de anos, quando o nosso Sol era uma protoestrela. Isso sugere que os aminoácidos são o resultado final de uma jornada química que começa com os tipos de Moléculas Orgânicas Complexas JWST que o telescópio encontrou ao redor da ST6.
A descoberta do JWST nos lembra que os ingredientes da vida não são exclusivos da nossa vizinhança cósmica. Eles são uma parte fundamental da receita universal para a formação de estrelas e planetas.
Afinal, se a química orgânica complexa floresce em um ambiente tão diferente e “primitivo” como a Grande Nuvem de Magalhães, quão comum será a vida em todo o cosmos?
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Perguntas Frequentes Sobre moléculas orgânicas detectadas pelo JWST
O que são Moléculas Orgânicas Complexas (COMs)?
COMs são moléculas que contêm carbono e possuem mais de seis átomos. Elas são consideradas os precursores químicos dos blocos de construção da vida, como aminoácidos e RNA.
Onde o JWST encontrou essas Moléculas Orgânicas Complexas?
O JWST detectou as COMs congeladas ao redor da protoestrela massiva ST6, localizada na Grande Nuvem de Magalhães (LMC), uma galáxia anã vizinha da Via Láctea.
Por que a detecção na Grande Nuvem de Magalhães é importante?
A LMC possui condições semelhantes às do universo primitivo (baixa metalicidade e alta radiação UV). A descoberta das Moléculas Orgânicas Complexas JWST neste ambiente ajuda a entender a rapidez com que os ingredientes da vida puderam se formar no início do cosmos.
Quais moléculas específicas foram identificadas pelo JWST?
Entre as COMs identificadas estão o acetaldeído, o ácido acético, o etanol, o metanol e o formato de metila.
O que acontece com as COMs congeladas quando a estrela se forma?
À medida que a protoestrela se aquece, o gelo que contém as COMs sublima, transformando-se em gás. Na fase gasosa, essas moléculas podem reagir e formar estruturas ainda mais complexas, como aminoácidos.
A descoberta das Moléculas Orgânicas Complexas JWST significa que há vida na LMC?
Não. A descoberta significa que os ingredientes químicos essenciais para a vida estão presentes e se formando em outras galáxias. Isso aumenta a probabilidade de que a vida possa surgir em muitos lugares do universo.
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Fonte: “Protostars at Subsolar Metallicity: First Detection of Large Solid-state Complex Organic Molecules in the Large Magellanic Cloud”
Publicação científica: The Astrophysical Journal Letters, DOI 10.3847/2041-8213/ae0ccd
