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NGC 6789: A Galáxia Solitária Que Desafia Tudo o Que Sabemos Sobre Formação Estelar

Imagine uma galáxia completamente isolada no vazio cósmico, longe de qualquer vizinha, e ainda assim produzindo estrelas novas como se tivesse acabado de colidir com outra galáxia. Parece impossível, certo? Pois é exatamente isso que a NGC 6789 está fazendo, e os astrônomos acabam de descobrir algo que pode reescrever o que sabemos sobre o nascimento de estrelas.

A NGC 6789 é uma galáxia anã azul compacta que vive no Local Void, uma região do universo tão vazia que faz o espaço sideral parecer lotado. Descoberta em 1883, essa pequena galáxia fica a cerca de 12 milhões de anos-luz da Terra. Apesar do isolamento extremo, ela tem um núcleo brilhante repleto de estrelas jovens. Assim, cientistas espanhóis decidiram investigar mais a fundo usando o telescópio Two-meter Twin Telescope (TTT3) para descobrir de onde vem o combustível para essa fornalha estelar.

O Mistério da Fábrica de Estrelas Solitária

Durante décadas, os astrônomos acreditavam ter entendido como galáxias formam estrelas. Normalmente, quando uma galáxia colide com outra ou engole uma companheira menor, o choque gravitacional comprime nuvens de gás e poeira, criando berçários estelares. Além disso, fluxos de gás podem ser puxados de galáxias vizinhas, alimentando explosões de formação estelar.

Contudo, a NGC 6789 joga essa teoria pela janela. Ela está completamente sozinha no vazio espacial, sem nenhuma galáxia próxima para interagir. Mesmo assim, cerca de 4% de sua massa estelar total — aproximadamente 100 milhões de massas solares — foi formada nos últimos 600 milhões de anos. Enquanto isso, sua estrutura externa permanece intocada, exibindo uma forma elíptica suave e avermelhada que não mostra sinais de colisões ou fusões galácticas.

Portanto, surge a pergunta que tem deixado os cientistas coçando a cabeça: de onde está vindo todo esse gás?

GC6789 vista pelo Sloan Digital Sky Survey (painel esquerdo) e pela imagem profunda obtida com o telescópio TTT3 (painel direito). Em ambos os casos, as imagens coloridas foram criadas usando uma combinação dos filtros Sloan g, r e i. Na distância da galáxia, de 3,6 Mpc, um arco de minuto corresponde a aproximadamente 1,1 kpc. O fundo em preto e branco da imagem corresponde ao filtro g, que é o nosso conjunto de dados mais profundo. Crédito: arXiv (2025). DOI: 10.48550/arxiv.2511.07041
GC6789 vista pelo Sloan Digital Sky Survey (painel esquerdo) e pela imagem profunda obtida com o telescópio TTT3 (painel direito). Em ambos os casos, as imagens coloridas foram criadas usando uma combinação dos filtros Sloan g, r e i. Na distância da galáxia, de 3,6 Mpc, um arco de minuto corresponde a aproximadamente 1,1 kpc. O fundo em preto e branco da imagem corresponde ao filtro g, que é o nosso conjunto de dados mais profundo. Crédito: arXiv (2025). DOI: 10.48550/arxiv.2511.07041

Mergulhando Nas Profundezas Com Imagens Ultra-Sensíveis

Para desvendar esse enigma, uma equipe liderada por Ignacio Trujillo, da Universidade de La Laguna na Espanha, realizou observações muito mais profundas da NGC 6789 do que qualquer estudo anterior. Usando o TTT3, os pesquisadores conseguiram enxergar detalhes extremamente fracos na galáxia, alcançando um brilho de superfície de cerca de 30 mag/arcsec² na banda g.

Essa sensibilidade é fundamental. Assim como uma fotografia com longa exposição revela estrelas invisíveis a olho nu, essas imagens profundas poderiam mostrar rastros estelares tênues — evidências de pequenas galáxias devoradas no passado. Se a NGC 6789 tivesse engolido uma galáxia anã menor, haveria correntes de estrelas ao seu redor, como migalhas deixadas após um banquete cósmico.

Dessa forma, os astrônomos vasculharam cada pixel das novas imagens procurando esses sinais reveladores. O resultado? Absolutamente nada.

Terceiro telescópio do Two-Meter Twin Telescope (TTT3) no Observatório do Teide, operado por Light Bridges, captando sua primeira luz do universo. Foto: J.C. Casado.
Terceiro telescópio do Two-Meter Twin Telescope (TTT3) no Observatório do Teide, operado por Light Bridges, captando sua primeira luz do universo. Foto: J.C. Casado.

Nenhuma Evidência de Colisões Galácticas

As observações confirmaram que a NGC 6789 mantém sua forma elíptica perfeita até uma distância radial de 1,5 arcominutos (equivalente a cerca de 1,6 mil anos-luz em sua distância). Além disso, a galáxia apresenta um gradiente de cor significativo devido ao seu núcleo azul e jovem contrastando com as regiões externas mais vermelhas e antigas.

Por outro lado, não há absolutamente nenhum sinal de características de maré gravitacional, restos de fusões ou correntes estelares. Os cientistas calcularam que, se alguma galáxia satélite tivesse sido despedaçada perto da NGC 6789, ela teria deixado para trás no máximo 200 mil massas solares em estrelas dispersas.

Contudo, esse número é problemático. A região central de formação estelar da NGC 6789 contém cerca de 4 milhões de massas solares em estrelas novas. Portanto, se uma pequena galáxia tivesse sido a fonte do gás, ela simplesmente não teria material suficiente para alimentar toda essa atividade.

Imagem criada com o software Aladin Sky Atlas do Centro de Dados Astronômicos de Estrasburgo e com dados públicos em formato FITS do Pan-STARRS (https://panstarrs.stsci.edu/ Panoramic Survey Telescope And Rapid Response System
Imagem criada com o software Aladin Sky Atlas do Centro de Dados Astronômicos de Estrasburgo e com dados públicos em formato FITS do Pan-STARRS (https://panstarrs.stsci.edu/ Panoramic Survey Telescope And Rapid Response System

Duas Hipóteses Intrigantes

Sem evidências de fusões galácticas, os pesquisadores propõem duas explicações fascinantes para o surto de formação estelar na NGC 6789.

Hipótese 1: Gás Residual Interno

A primeira possibilidade é que a galáxia ainda tenha reservas de gás primordial escondidas em seu interior. Assim, ao longo de bilhões de anos, esse gás pode ter se acumulado gradualmente no núcleo galáctico devido à própria gravidade da NGC 6789. Eventualmente, a densidade aumentou o suficiente para desencadear uma explosão de formação estelar.

Dessa forma, seria como se a galáxia estivesse usando suas próprias economias de gás em vez de pedir emprestado de vizinhas. Essa hipótese sugere que galáxias isoladas podem ter ciclos internos de formação estelar muito mais complexos do que imaginávamos.

Hipótese 2: Acreção de Gás Pristino

A segunda explicação é ainda mais intrigante. Talvez a NGC 6789 tenha capturado gás fresco diretamente do meio intergaláctico — filamentos tênues de hidrogênio que fluem através do cosmos como rios invisíveis no vazio espacial. Esse gás pristino, nunca processado por outras estrelas, poderia ter sido gradualmente sugado pela gravidade da galáxia ao longo de centenas de milhões de anos.

Enquanto isso, como esse gás não veio de outra galáxia, não há estrelas associadas a ele — por isso as imagens profundas não revelaram correntes estelares. Além disso, essa teoria implica que até mesmo galáxias completamente isoladas no vazio cósmico podem se alimentar diretamente da teia cósmica de matéria que permeia o universo.

O Que Isso Significa Para Nossa Compreensão do Cosmos

A NGC 6789 está nos ensinando que a formação de estrelas é mais diversa e resiliente do que pensávamos. Nem todas as galáxias precisam de fusões dramáticas ou interações violentas para criar novas gerações de estrelas. Assim, processos mais sutis e gradualmente podem ser igualmente eficazes.

Além disso, essa descoberta tem implicações importantes para nossa compreensão das galáxias anãs em geral. Esses pequenos sistemas estelares são os blocos de construção fundamentais do universo, e entender como eles evoluem — mesmo em isolamento — nos ajuda a reconstruir a história cósmica.

Por fim, a NGC 6789 nos lembra que o universo ainda guarda muitos segredos. Cada vez que desenvolvemos telescópios mais potentes e técnicas de observação mais sensíveis, descobrimos que nossas teorias precisam de ajustes. O cosmos é mais estranho, mais diverso e mais fascinante do que jamais imaginamos.

“NGC 6789 não é facilmente observável, pois está tão ao norte que nunca sobe mais do que 3° acima do horizonte. Imagem composta em cores dos filtros R/B da Second Digitized Sky Survey (DSS2), cobrindo 10 minutos de arco. Créditos: the-sky.org
NGC 6789 não é facilmente observável, pois está tão ao norte que nunca sobe mais do que 3° acima do horizonte. Imagem composta em cores dos filtros R/B da Second Digitized Sky Survey (DSS2), cobrindo 10 minutos de arco. Créditos: the-sky.org

A Jornada Continua

As novas imagens da NGC 6789 abrem mais perguntas do que respostas — e isso é exatamente o que torna a astronomia tão empolgante. Como exatamente uma galáxia isolada no vazio cósmico consegue acumular gás suficiente para um surto de formação estelar? Existem outras galáxias solitárias fazendo a mesma coisa? O que mais estamos perdendo por não olhar com profundidade suficiente?

Observações futuras com telescópios ainda mais poderosos podem revelar correntes de gás invisível ou estruturas extremamente tênues que as atuais imagens não conseguiram detectar. Portanto, o mistério da NGC 6789 está longe de ser resolvido — ele está apenas começando.

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Perguntas Frequentes Sobre a NGC 6789

Onde fica a galáxia NGC 6789? A NGC 6789 está localizada no Local Void, uma região com muito poucas galáxias, a cerca de 12 milhões de anos-luz da Terra. Ela foi descoberta em 1883 e é classificada como uma galáxia anã azul compacta.
Por que a NGC 6789 é considerada tão isolada? Ela está situada no Local Void, uma região do espaço com densidade de galáxias muito abaixo da média cósmica. Não há galáxias próximas com as quais ela possa interagir gravitacionalmente, tornando seu isolamento extremo.
Como uma galáxia isolada consegue formar novas estrelas? Normalmente, galáxias formam estrelas após colisões ou capturando gás de vizinhas. Contudo, a NGC 6789 pode estar usando gás residual interno ou capturando gás pristino diretamente do meio intergaláctico, sem interações com outras galáxias.
O que as novas observações revelaram sobre a NGC 6789? Imagens profundas obtidas com o telescópio TTT3 não mostraram evidências de fusões galácticas, correntes estelares ou restos de colisões. A galáxia mantém uma forma elíptica suave até grandes distâncias, sem sinais de perturbações.
Quantas estrelas novas a NGC 6789 formou recentemente? Aproximadamente 4% de sua massa estelar total — cerca de 100 milhões de massas solares — foi formada nos últimos 600 milhões de anos. A região central contém cerca de 4 milhões de massas solares em estrelas jovens.
O que é o Local Void? O Local Void é uma vasta região do espaço com muito menos galáxias do que outras áreas do universo. É um dos grandes vazios cósmicos conhecidos, onde a densidade de matéria é significativamente menor que a média.
Por que essa descoberta é importante? Ela desafia a teoria tradicional de que galáxias isoladas não deveriam ter surtos de formação estelar sem interações com vizinhas. Isso sugere que processos internos ou captura de gás intergaláctico são mais comuns do que se pensava.

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Fonte: Artigo “Deep imaging of the very isolated dwarf galaxy NGC6789” Cite as: arXiv:2511.07041 [astro-ph.GA] (or arXiv:2511.07041v1 [astro-ph.GA] for this version) https://doi.org/10.48550/arXiv.2511.07041

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